Leishmaniose Canina

I – Introdução:
A leishmaniose visceral canina (LVC) é uma doença provocada pelo protozoário Leishmania chagasi, transmitido através da picada do mosquito Lutzomyia longipalpis contaminado, que afeta o homem e os animais, particularmente o cão doméstico, e é motivo de pesquisa em várias partes do mundo com várias tentativas terapêuticas.
A doença em geral afeta cães sadios, ao contrário do que ocorre em humanos que geralmente quando afetados estão sob alguma condição imunossupressora. Nos cães a LVC é uma doença imunomediada.
O tratamento canino não obtém em geral a cura, mas pode oferecer uma boa qualidade de vida e maior longevidade aos animais afetados. Este procedimento exige dos proprietários dos cães um compromisso de cuidados especiais com os animais infectados e também do ambiente onde vivem.
II – O agente:
A Leishmania chagasi é um protozoário da família Kinetoplastida, pertencente ao Complexo Leishmania donovani, e provoca a leishmaniose visceral no continente americano. Este protozoário necessita de 2 tipos de hospedeiros, sendo um hospedeiro vertebrado (homem, canídeos) e um hospedeiro invertebrado (mosquito palha). No hospedeiro vertebrado ele penetra através da picada do mosquito infectado e alcança as vísceras (medula óssea, baço, fígado, sistema linfático, etc) e se reproduz por fissão binária na forma amastigota. No mosquito, que se infecta ingerindo líquido tissular e sangue de um animal ou homem infectado, ele se reproduz sob a forma promastigota, permanecendo no trato digestivo do inseto. Desta forma este protozoário se mantem na natureza.
III – A doença:
Um cão, após ser contaminado por um mosquito infectado, apresenta um período de incubação bastante variado que vai de 2 meses até 6 anos. Em geral os primeiros anticorpos são observados em 45 dias após a infecção.
No mosquito, o período entre a contaminação e a eliminação da forma infectante (promastigota metacíclico), atinge de 4 a 21 dias.
A doença decorre da visceralização do agente e de sua reprodução e colonização das células do hospedeiro vertebrado, principalmente as células do Sistema Mononuclear Fagocitário. Naqueles animais sensíveis haverá maior manifestação dos sinais clínicos.
IV – Sinais Clínicos:
.Dermatológicos:
- Reação no local da infecção = associado à picada do mosquito vetor. Também chamado por Vidor et al. (1991) como “Chancro de inoculação”; surge cerca de 20 dias após a infecção.
- dermatite seborreica
- alopecia periorbital
- hiperqueratoses
- nódulos subcutâneos
- onicogrifose
- ausência de prurido
- erosões e úlceras (pontas de orelha/focinho)
.linfadenomegalia
.emagrecimento
.abatimento, fadiga, prostração
.febre
.anemia
.nefrite
.hepatoesplenomegalia
.hemorragias (melenas, epistaxe)
.poliartrites
.lesões oculares (blefaroconjuntivites/ceratoconjuntivite/hemorragias retinianas)
** em condições naturais 60% dos cães doentes são assintomáticos
V – Diagnóstico:
.Clínico
.Parasitológico
*punção de medula óssea
*punção de linfonodos palpáveis
*punção hepática e esplênica
*biópsia de pele e/ou vísceras
.Sorológico
*Reação de Imunofluorescência Indireta (RIFI) (podem haver Reações Cruzadas com Babesia canis e Erlichia canis).
*Reação de Fixação de Complemento (RFC)
*Elisa
*TRALD (Teste Rápido Anti-Leishmania donovani)
.Hemograma = normal/ anemia normocrômica ou normocítica não regenerativa.
.Provas de Função renal (uréia e creatinina) = normal a azotemias
Função hepática (ALT/Fosfatase Alcalina) = normal e hepatopatias
.Proteinograma = hipergamaglobulinemia com inversão do perfil normal A/G que é igual a 1.
VII – Diagnóstico Diferencial:
.Seborréia
.Piodermas
.Dermatofitoses
.Demodicioses
.Escabioses
.Cheyletioses
.Atopia
.Enfermidades Autoimunes (Lupus / Pênfigo)
.Neoplasias
.Hepatozoonose
.Erliquiosis
.Tuberculoses
.Doença de Lyme.
VIII – Medidas Pré-tratamento:
1-Avaliação Clínica do Paciente
-Quadro clínico do paciente
-hemograma
-perfil bioquímico
-sorologia
-proteinograma (eletroforese das proteínas séricas)
-diagnóstico parasitológico
2-Informação ao Proprietário
-explicação detalhada da doença – crônica e incurável
-possibilidade de transmissão
-adoção de medidas profiláticas
-custos do tratamento:
-medicação
-serviços veterinários
3-Critérios de Tratamento:
4-Medidas Adicionais:
.Seguimento estrito de todos os casos
.medidas antivetoriais eficazes:
*pulverização ambiental mensal
*banhos inseticidas semanais nos cães
*usos de coleiras inseticidas/fitas impregnadas nos canis/borrifação com piretróides tópicos, fipronil, etc.
IX – Drogas usadas no tratamento:
1-Fármacos Disponíveis:
*a)Antimoniais:
-são utilizados os antimoniais pentavalentes:
.antimoniato de n-metil glucamina (Glucantime)
.estibogluconato de sódio (Pentostam)
-seu mecanismo de ação ainda não é totalmente claro e parecem agir bloqueando a atividade enzimática dos parasitos, tendo um efeito leishmanicida.
-sua toxicidade pode ser comparada à dos antibióticos aminoglicosídeos (gentamicina).
*b)Diamidinas:
-a diamidina mais empregada é a pentamidina (Lomidine)
–seu mecanismo de ação consiste em provocar uma alteração no metabolismo do parasito, agindo sobre as mitocôndrias, o cinetoplasto, a bolsa flagelar e os ribossomas, com efeito leishmanicida.
-são mais tóxicas que os antimoniais pentavalentes e possuem menor eficácia e exigem maior tempo de terapia.
*c)Antibióticos derivados dos Polienos:
-Hiamicina/ Sinefungina/ Nistatina/ Anfotericina B
-A droga mais usada é a Anfotericina B
-Agem interrompendo as membranas celulares dos microorganismos, provocando a morte dos protozoários.
-são fortemente tóxicas.
*d)Antibióticos aminoglicosídeos:
-paranomicina/aminosidina
-mecanismo de ação desconhecido
-sinergia com antimoniais
-toxicidade relativa
*e)Derivados do Imidazol:
-são mais estudados na terapia da leishmaniose cutânea
-Metronidazol (Flagyl)/ Secnidazol (Flagentil)/ Cetoconazol (Panfugol).
-possui mecanismo de ação semelhante ao da Anfotericina B.
-são relativamente pouco tóxicos.
-resultados irregulares.
*f)Análogos das Purinas: Pirazolopirimidinas:
-principal droga = alopurinol (Zyloric)
–tem ação leishmaniostática
-sinérgico com drogas leishmanicidas
-são em geral pouco tóxicas.
2-Terapia de Suporte:
-Imunomoduladores:
*imunossupressores (prednisona/prednisolona)
*imunoestimulantes (levamizol/Baypamum).
-Lipossomas
-Antibioticoterapia de amplo espectro de ação
-fluidoterapia
-dietas especiais (voltadas para pacientes nefropatas).
X-Protocolos de Tratamento:
Os protocolos de tratamento são escolhidos de acôrdo com o estado geral do paciente, levando-se sempre em consideração que para a determinação do seu estado geral se fazem necessários, além da avaliação clínica, exames laboratoriais que possam avaliar a função renal, a função hepática, as proteínas séricas, além da sorologia específica para leishmaniose visceral confirmadas pelo diagnóstico parasitológico.
Cada protocolo poderá ser escolhido pelo clínico de acôrdo com a combinação dos resultados obtidos pelos exames:
Protocolo 1:
Glucantime + Zyloric = doses altas
*para cães com bom estado geral (clínico e laboratorial)
Glucantime= 100 a 200 mg/kg BID 21 dias
Zyloric= 20 mg/kg BID – 6 a 8 meses
Protocolo 2:
Glucantime + Zyloric = doses baixas
*para cães com patologias secundárias ou com idade avançada , mas que apresentem perfil bioquímico satisfatório
Glucantime= 60 a 100 mg/kg dividido 2 vezes ao dia – 21 dias
Zyloric= 5 a 10 mg/kg dividido 2 vezes ao dia – uso constante.
Protocolo 3:
*cães em bom estado geral e sem sinais de doença renal
.Prednisona= 1 mg/kg/dia (3 dias anteriores ao início do tratamento)
.Fungizona=
dia 1 = 0,2 mg/kg
dia 2 = 0,3 mg/kg
dia 3 = 0,4 mg/kg
.manutenção da dose do dia 3 por 15 dias
.via endovenosa (perfusão lenta em 100 ml de soro glicosado isotônico)
.Zyloric= 20 mg/kg dividido 2 vezes ao dia – sem interrupção.-
*faz-se 2 tratamentos com um intervalo de descanso de 15 dias.-
Protocolo 4:
*Indicado naqueles casos de pacientes graves ou que apresentem estiboresistências, estibointolerâncias, rescidivas leves, cutâneos atípicos.
.Zyloric= 10 – 30 mg/kg/dia durante 6 a 18 meses.
XI – Avaliação do Tratamento:
.Controle clínico a cada 2 meses
.Controle sorológico e bioquímico a cada 3 meses
*Um novo ciclo de tratamento deverá ser instaurado quando:
-houver reaparição da sintomatologia
-proteinograma alterado
-soroconversão – elevação de 2 títulos.
XIII – Controle:
- controle de cães com donos (aplicação de inseticidas semanais)
- controle de abrigos de cães
- controle dos cães de rua
- elaboração de textos explicativos aos clientes
- busca de um protocolo comum de tratamento entre os clínicos
- controle do vetor (borrifação intradomiciliar e peridomiciliar)
*É necessário um bom relacionamento com a saúde pública com mútua cooperação e orientação.
Fonte: Critérios de tratamento para a Leishmaniose Canina, escrito pelo Médico Veterinário Dr.Vitor Márcio Ribeiro – CRMV-MG 1883
Fonte de pesquisa: Wikipédia
Veja também: Doenças